sábado, 26 de novembro de 2011

Carta a presidente Dilma: Política para Álcool e Drogas


MOBILIZAÇÃO
Carta à Presidenta Dilma: Por uma Política de Álcool e Outras Drogas Não Segregativa e Pública
PSI site crpsp.org - Publicado em 25/11/2011 13:34:50

Proposta pela Rede Nacional Internúcleos de Luta Antimanicomial (RENILA), a carta à Presidenta Dilma: Por uma Política de Álcool e Outras Drogas Não Segregativa e Pública, recebeu a coassinatura do CFP e também do CRP SP. O importante documento defende o fortalecimento do Sistema Único de Saúde e uma sociedade sem manicômios. 

A carta também demonstra preocupação com a constante veiculação, através de setores da imprensa, da defesa da internação compulsória e das comunidades terapêuticas como fórmulas mágicas para o tratamento dos usuários de álcool e outras drogas. 

"Tais soluções opõem-se, radicalmente, aos princípios que sustentam o compromisso desse governo de trabalhar pela ampliação da cidadania e inclusão de todos (...).Se tais medidas forem implantadas produzirão, além de prejuízos políticos, danos à democracia brasileira. Uma das maiores referências e patrimônio da nossa sociedade, o SUS e várias de suas políticas, dentre estas, a Reforma Psiquiátrica, serão seriamente comprometidas, além de perderem o caráter público tão caro à saúde", afirma o documento.
 

Leia abaixo a íntegra da carta:
Carta à Presidenta Dilma 

Por uma Política de Álcool e Outras Drogas 

Não Segregativa e Pública 

A eleição de uma mulher presidenta da república, pela primeira vez na história, nos encheu de orgulho e foi festejado pelos brasileiros e brasileiras, em particular por todos os movimentos sociais, organizações populares e sindicais que lutam junto aos setores mais vulneráveis de nossa sociedade, pela ampliação dos direitos e de uma cidadania ativa. O compromisso definido como central para seu governo _ o combate e eliminação de uma das principais mazelas da sociedade brasileira, a pobreza e a miséria _ traduz, para nós, sua sensibilidade e filiação à Construção de um Novo Brasil, mais justo e solidário. 

Esse compromisso assumido com o povo brasileiro é motivo de esperança e perspectivas de avanços no processo de inclusão social e de ampliação das conquistas cidadãs. 

Nós, da RENILA - Rede Nacional Internúcleos de Luta Antimanicomial, presentes em todo o país, militamos pela construção de uma sociedade sem manicômios, projeto político que originou e inspira a Reforma Psiquiátrica brasileira, política pública que é referência para a Organização Mundial da Saúde. Apostamos que o atual governo iria avançar e aprofundar esse processo emancipatório, extinguindo os manicômios ainda existentes e em funcionamento e ampliando a rede substitutiva, contudo, estamos neste momento, seriamente preocupados com o futuro e os rumos da saúde mental brasileira. 

Informações veiculadas com insistência pela imprensa sobre as possibilidades de tratamento para usuários de álcool e outras drogas preocupa-nos, sobretudo, por seu caráter francamente contrário aos princípios que sustentam as políticas deste governo, a saber, a superação da exclusão social, condição historicamente imposta a uma parcela da sociedade brasileira. Como militantes sociais e de direitos humanos, queremos alertar para os riscos que se anunciam nestas propostas. 

O primeiro e mais grave risco diz respeito ao modo como a questão é colocada: ameaça, que fundada na cultura do medo, produz pânico e autoriza a violência, além de solicitar respostas precipitadas e superficiais. A apresentação de soluções mágicas, de respostas totais e plenas de garantias é não apenas ilusório, mas, sobretudo falacioso. Preocupa-nos, de modo particular, a defesa da internação compulsória e das comunidades terapêuticas, dois modos de resolver a questão recorrendo à exclusão e a segregação. Tais soluções opõem-se, radicalmente, aos princípios que sustentam o compromisso desse governo de trabalhar pela ampliação da cidadania e inclusão de todos. Portanto, não tem como dar certo! 

Senhora Presidenta, se tais medidas forem implantadas produzirão, além de prejuízos políticos, danos à democracia brasileira. Uma das maiores referências e patrimônio da nossa sociedade, o SUS e várias de suas políticas, dentre estas, a Reforma Psiquiátrica, serão seriamente comprometidas, além de perderem o caráter público tão caro à saúde. Submeter a saúde a interesses privados, à lógica de mercado, é fazê-la retroceder ao ponto que inaugurou o SUS como direito; é impor a saúde à dimensão de objeto mercantil, gerador de lucro para alguns e dor para muitos. Submeter o Estado e as políticas públicas a crenças e confissões, fere um princípio constitucional e a dimensão laica do mesmo. Submeter os cidadãos e suas famílias que sofrem com uma dependência a um modo de proteção que anula direitos é legitimar a violência como resposta institucional, portanto, não é uma ação cidadã, nem tão pouco solidária; é violência e tortura admitidas como recurso de tratamento. 

Senhora Presidenta, mantendo nossa confiança e aposta em seu compromisso público anunciado quando de sua posse, mas também em sua sensibilidade e capacidade para conduzir um projeto de nação que seja justo, solidário e cidadão, alertamos: não se pode admitir o sequestro de direitos como recurso de tratamento, não se pode admitir a redução de problemas complexos a soluções mágicas, não se pode admitir, acima de tudo, a banalização de valores democráticos em nome de nenhum mal. Não se pode fazer o mal em nome do bem! Não se autoriza ao Estado e nem à sociedade, o direito a desrespeitar e torturar ninguém, em razão de nenhum motivo. 

Sabendo que um governo se compõe de forças distintas e de perspectivas diversas, articuladas a setores e interesses sociais múltiplos, alguns mais próximos e comprometidos com valores republicanos, e outros com perspectivas mais restritas e a valores morais e religiosos, identificados na Casa Civil, conclamamos a Chefe da Nação a defender a cidadania de todos e a democracia brasileira, preservando suas conquistas, de modo especial, o Sistema Único de Saúde e suas políticas. 

Nossa posição não é sustentada em interesses particulares nem em preferências. É coerente com a ampla mobilização social em todo o país que resultou na IV Conferência Nacional de Saúde Mental - Intersetorial, fórum que foi claro e decidido neste ponto: comunidades terapêuticas não cabem no SUS, como também não cabem internações compulsórias. O tratamento dos usuários de álcool e outras drogas, incluído neste conjunto o crack, deve seguir os princípios do SUS e da Reforma Psiquiátrica, sendo também este o caminho a ser trilhado pelo financiamento: a ampliação da rede substitutiva. 

Senhora Presidenta, o Brasil precisa de mais CAPS-ad, necessita que os mesmos tenham condições que os permitam funcionar vinte e quatro horas, carece de leitos em hospital geral, de casas de acolhimento transitório, consultórios de rua, equipes de saúde mental na atenção básica, de estratégias de redução de danos e de políticas públicas intersetoriais. Este deve ser o endereço dos recursos públicos! 

Por uma Sociedade Sem Manicômios!! Por um Tratamento Sem Segregação!! Pelo Fortalecimento do Sistema Único de Saúde e da Reforma Psiquiátrica!!

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Trabalho e Jogos: Vícios ocultos


Trabalho ou jogos podem ser tão viciantes quanto álcool ou drogas

Jogadores e workaholics enfrentam síndrome de abstinência com sintomas como depressão, ansiedade e insônia

BBC Brasil | 25/11/2011 10:12



Trabalhar demais também pode ser um vício

O psicólogo britânico Mark Griffiths, professor da Nottingham Trent University, vem estudando o jogo compulsivo há 25 anos e diz acreditar "enfaticamente" que o ato de jogar e apostar, se levado ao extremo, é tão viciante quanto qualquer droga.
Neste texto escrito para a BBC, ele comenta os resultados de seu trabalho:
"Os efeitos sociais e de saúde da jogatina extremada são muitos e têm muita coisa em comum com os efeitos de vícios mais tradicionais, entre eles mau humor, problemas de relacionamento, absenteísmo do trabalho, violência doméstica e ir à falência.
Os efeitos para a saúde - para jogadores e seus parceiros e parceiras - incluem ansiedade, depressão, insônia, problemas intestinais, enxaquecas, stress, problemas estomacais e pensamentos suicidas.
Se comportamentos como a jogatina podem se tornar um vício genuíno, não existe razão em teoria que impediria alguém de se viciar em atividades como videogames, trabalho ou exercícios físicos.
Pesquisas sobre jogadores compulsivos relatam que eles sofrem ao menos um efeito colateral quando passam por períodos de abstinência, como insônia, dores de cabeça, perda de apetite, fraqueza física, palpitações cardíacas, dores musculares, dificuldades de respiração e calafrios.
Abstinência 

Na verdade, jogadores compulsivos aparentam sofrer mais sintomas de abstinência física quando tentam cortar o vício do que viciados em drogas.
Mas quando é exatamente que um entusiasmo saudável se transforma em um vício? Comportamento excessivo por si só não significa que alguém seja viciado. Consigo pensar em muitas pessoas que se envolvem em atividades excessivas, mas eu não as classificaria como viciadas, já que elas parecem não sofrer qualquer efeito negativo ao apresentar tal comportamento.
Em essência, a diferença fundamental entre o excesso de entusiasmo e o vício é que os entusiastas saudáveis adicionam vida às atividades desprovidas dela.
Para qualquer comportamento ser definido como viciante, é preciso que existam consequências específicas como se tornar a atividade mais importante na vida de uma pessoa ou ser o meio pelo qual o humor dela pode melhorar.
Eles podem também começar a precisar fazer mais e mais da atividade ao longo do tempo para sentir seus efeitos e sentir sintomas físicos e psicológicos de abstinência se eles não conseguem fazê-lo.
Isso pode levar a conflitos com o trabalho e com responsabilidades pessoais e muitos podem até viver recaídas se tentam largar o vício.
A maneira pela qual os vícios se desenvolvem - sejam eles químicos ou comportamentais - é complexa.

Vícios 'ocultos' 

O comportamento viciante se desenvolve a partir de uma combinação de predisposição biológica e genética de uma pessoa, o ambiente social em que elas cresceram e sua constituição psicológica, como traços de personalidade, atitudes, experiências e crenças e a própria atividade.
Muitos vícios comportamentais são vícios ''ocultos''. Diferentemente do alcoolismo, o viciado em trabalho não apresenta a fala embolada ou sai tropeçando.
Mas, no entanto, o vício comportamental é um tema relativo a saúde que precisa ser levado a sério por todos os profissionais das áreas médicas ou de saúde.
Se o principal objetivo dos profissionais da área médica é garantir a saúde de seus pacientes, então ter consciência sobre o vício comportamental e os temas que o cercam deveriam ser tão importantes quanto o conhecimento básico e o treinamento.
Diversos vícios comportamentais podem ser tão graves quanto vícios em drogas."

domingo, 20 de novembro de 2011

Alcoolismo: Descoberto gene que impede a recuperação


Cientistas descobrem gene que impede recuperação de alcoolismo


Alcoólatras que carregam variante do gene correm mais risco de morte prematura e têm mais recaídas

por Redação Galileu

Pesquisadores da Universidade de Gothenburg, na Suécia, descobriram que pessoas que carregam uma variante especifica de um gene e são dependentes de álcool têm mais risco de sofrer morte prematura. Eles investigaram o gene receptor da dopamina D2.
O estudo mostrou que dependentes de bebida alcoólica que também carregam a variante genética apresentam 10 vezes mais chance de morte prematura comparados à média da população.
Em um estudo recente, publicado na revista Alcohol and Alcoholism, pela mesma equipe, eles mostram que a mesma variante genética parece estar associada tendência de recaídas em dependentes, mesmo quando eles estão em programas de tratamento. Essa provavelmente é uma das explicações para o maior risco de morte prematura dessas pessoas.
Para os cientistas, o conhecimento dessa variante genética pode ajudar a identificar os casos de alcoolismo que merecem mais atenção nos programas de tratamento dadas as consequências mais sérias que as pessoas portadoras da variação podem sofrer.

Após a copa o álcool será liberado nos estadios?


Clubes contam com liberação de álcool em estádios no pós-Copa


Folha de São Paulo - MARTÍN FERNANDEZ
RODRIGO MATTOS DE SÃO PAULO

Com a provável liberação de bebidas alcoólicas para jogos da Copa-2014, clubes veem como natural a extensão da permissão após o evento. Avaliam que governos e a CBF não terão como retomar a proibição depois do Mundial.
Quatro de cinco dirigentes ouvidos pela Folha falam em iniciar movimento para também poder vender cerveja.
A motivação é econômica. Estudos dos clubes mostram que a comercialização da bebida teria impacto significativo na renda de suas arenas.
A proibição de álcool em estádios ocorreu em 2008 em acordo entre a CBF e o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais para reduzir a violência nas arenas do país. É ratificado por leis estaduais, como a de São Paulo.
"A partir do momento em que for liberado para a Copa, vai ficar complicado restringir depois. Vai ser muita cara de pau. Com base em que vão fazer a exceção?", disse Rogério Dezembro, responsável da WTorre na Arena Palestra, futura casa do Palmeiras.
O dirigente disse ter estudo que mostra impacto "razoável" do álcool na receita.
É o que reforça o Corinthians sobre a renda de seu novo estádio, em Itaquera, sede da abertura do Mundial.
"Temos dois estudos de estimativa de ganho com alimentação e bebida no estádio: um com cerveja e outro sem cerveja. A diferença é de algo entre 20% e 30%", explicou o gerente de marketing corintiano, Caio Campos.
Além da receita, o álcool facilita a manutenção do público no estádio, aumentando o consumo de outros itens.
Isso se aplica especialmente às arenas em construção que terão camarotes, restaurantes e bares. A ideia é que o torcedor chegue mais cedo aos jogos e saia mais tarde.
"Visitamos estádios do mundo inteiro. Em quase todos eles, a bebida é permitida", disse Eduardo Antonini, presidente da Grêmio Empreendimentos, responsável pela nova arena do time gaúcho.
O conselho de procuradores, no entanto, é contrário à demanda dos clubes. Admite uma brecha só no Mundial.
"Na Copa, com raríssimas exceções, há um clima de confraternização", disse Cláudio Lopes, presidente do conselho. "Nos jogos daqui, há clima de guerrilha, pela rivalidade entre torcidas."
Segundo Lopes, o conselho tem números que mostram a redução da violência nos estádios sem álcool. Clubes argumentam que torcedores entram alcoolizados por beberem do lado de fora.
"Esse dinheiro não reverte para o clube. É limitação que não atende à segurança", contou José Mansur, assessor da presidência do São Paulo.
Relator da Lei Geral da Copa, o deputado Vicente Cândido (PT-SP) não quis falar sobre o assunto. Ele está no centro da discussão, reaberta, mas que agora envolve álcool e dinheiro em volumes nunca vistos anteriormente no futebol brasileiro.

Cartilha sobre droga é distribuida em escolas do RJ


Escolas do Rio receberão cartilha com orientações sobre os perigos do consumo das drogas



Da Agência Brasil

Rio de Janeiro – O governo do Rio de Janeiro, lançou hoje (16) no Colégio Estadual Jornalista Tim Lopes, no Complexo do Alemão, uma cartilha com orientações sobre os perigos e males causados pelo consumo de drogas. Com uma tiragem de 200 mil exemplares, a cartilha será, inicialmente, distribuída para professores da rede estadual de ensino, para as varas de Infância e Juventude e para alunos do ensino médio que tenham até 18 anos de idade.
Com o título Tudo o Que Você Pensa Que Sabe sobre Drogas, a cartilha tem 34 páginas e traz as informações com linguagem de fácil acesso para os estudantes. O material é resultado de uma pesquisa de quase dois anos, feita em presídios do estado. A pesquisa revelou que a maioria dos 500 entrevistados, com idades entre 18 a 25 anos, tinha cometido algum crime relacionado ao consumo ou ao tráfico de drogas. Já 80% dos pesquisados admitiram ser usuários de drogas.
O secretário estadual de Ciência e Tecnologia, Alexandre Cardoso, lembrou que o combate às drogas só é possível com investimentos em educação e saúde. “Esse é um tema que nós temos que levar para toda sociedade. Essa questão da epidemia do crack se combate com educação, com ciência, com tecnologia e principalmente com pesquisa”, disse.
Cardoso também pediu apoio do setor privado, na tentativa de captar recursos para a confecção de mais 1,5 milhão de cartilhas, para que sejam levadas também a todas as comunidades e presídios do estado.
De acordo com o professor Oswaldo Munteal, responsável pela pesquisa, o material produzido tem como principal objetivo fazer com que os jovens saibam tudo sobre o uso de drogas. Por meio de orientações sobre como ocorre a dependência química e os danos que ela pode causar ao usuário, o professor quer acabar com o que chamou de “holocausto brasileiro”. "Os números do consumo de drogas são alarmantes. Não é brincadeira, só quem viu sabe. Foi uma pesquisa real, dentro da situação e nós ouvimos histórias realmente deprimentes", acrescentou.
Segundo Munteal, três estados do Nordeste já demonstraram interesse no projeto e pretendem usar a cartilha em suas escolas.
Edição: Lana Cristina

Da Cracolândia para o Coral da Cristolândia


Da Cracolândia para o Coral da Cristolândia


Jornal O Estado de S. Paulo 20/11/2011
Cerca de 200 ex-viciados formam o conjunto comandado pelo maestro Roberto Minczuk, titular da Orquestra Sinfônica Brasileira
PAULO SAMPAIO - O Estado de S.Paulo

Dependente de LSD e de todo tipo de psicotrópico desde jovem, Ailton da Silva Ferreira, de 52 anos, que já tinha chegado ao crack, considera-se recuperado há dois anos. Francis Almeida, de 36, que foi da maconha à cracolândia em uma década, também conta uma história de final feliz. Hideraldo Pussick Laval, de 34, entrou no vício há três anos, recém-chegado de Guiné-Bissau, e se diz "limpo" há 1 ano e 8 meses.
Os três fazem parte do Coral da Cristolândia, conjunto formado por 200 ex-viciados recolhidos na cracolândia, centro de São Paulo. Sob a batuta do maestro Roberto Minczuk, regente titular da Orquestra Sinfônica Brasileira, eles apresentam amanhã o Coral das Luzes na Praça Princesa Isabel, também no centro.
O programa de recuperação de viciados é uma iniciativa da Primeira Igreja Batista de São Paulo, cujo templo fica na própria praça, a menos de 500 metros da cracolândia. Livres das drogas, Ferreira e seus companheiros se dizem agora "viciados em Jesus". Eles enchem os pulmões para cantar em altos brados versos como "Senhor, eu sou livre para te adorar".
Muito agradecido à Igreja, que tem 3 milhões de fiéis no Brasil, Laval diz que, em seu tempo de cracolândia, a Prefeitura não fazia "nada de representativo para recuperar os viciados". "Passavam expulsando a gente."
O maestro Minczuk, que é evangélico, acredita que sua participação no concerto "é pequena, em comparação com o resgate de vidas que os voluntários vêm realizando". "Sou paulistano, moro na Praça Roosevelt, no centro da cidade, e estou muito próximo da realidade dura dos viciados em crack."
'Radicais'. Soraya Machado, de 46 anos, coordenadora do projeto, explica que trabalha com um grupo de 14 "radicais", como são chamados os jovens voluntários de todo o País que vão à cracolândia tentar recuperar viciados. "Primeiro, nós os atraímos para um café da manhã. O alimento é uma ferramenta importante", diz ela, que estima em 300 o número de ex-viciados que hoje são fiéis da Igreja, 80% deles homens.
Entre o café, a recuperação em clínicas parceiras e reabilitação social dos ex-viciados, o pastor Paulo Eduardo Vieira, de 48 anos, presidente da Igreja, diz que já foi gasto R$ 1 milhão. Não há colaboração de órgãos públicos. "São só donativos de fiéis", conta.

Consultório móvel de rua para tratar dependentes em SP



São Paulo terá consultório móvel para tratar viciados em crack, diz ministro da Saúde



Folha de São Paulo - FÁBIO BRANDT  DE BRASÍLIA

As unidades -chamadas “consultórios de rua”- são como “trailers” que funcionarão 24 horas. As equipes, compostas por médicos, enfermeiros e psicólogos, terão autonomia para decidir pela internação involuntária dos pacientes, disse o ministro. “Se o profissional de saúde avaliar que aquela pessoa corre risco de vida, nós temos protocolos claros da internação involuntária, inclusive defendida pela Organização Mundial da Saúde”, afirmou.
O ministro falou sobre o assunto no programa “Poder e Política – Entrevista”, conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues no estúdio do Grupo Folha em Brasília. O projeto é uma parceria do UOL e da Folha.
No Brasil, segundo Padilha, já há 80 consultórios de rua em cidades grandes. São Bernardo, Osasco, Goiânia e Brasília são algumas das cidades pioneiras no projeto, iniciado em 2010
LULA, DILMA E ELEIÇÃO
Padilha falou sobre polêmica suscitada com o início do tratamento que o ex-presidente Lula faz de um câncer na laringe. Para ministro, o plano médico do líder petista deve custear o tratamento porque foi pago regularmente. Mas disse que a polêmica é oportuna para levantar debate sobre necessidade de se melhorar do SUS.
Sobre a participação do PT na próxima eleição presidencial, em 2014, Padilha afirmou que decisão “vai acontecer no momento certo” e que caberá à presidente Dilma conduzir as discussões.
A seguir, trechos em vídeo da entrevista de Alexandre Padilha. Mais abaixo, vídeo com a íntegra da entrevista. A transcrição está disponível em texto.



Governo vai aumentar consultórios móveis para atendimento a usuários de drogas



Equipes irão até cracolândias e outros locais de concentração de dependentes químicos
Gazeta do Povo
O ministro da Saúde Alexandre Padilha disse neste sábado (19), em São Bernardo do Campo (SP), que o governo federal vem estudando um conjunto de ações envolvendo vários ministérios para lançar, em breve, um plano amplo de enfrentamento ao crack e outras drogas, que inclui o serviço de consultórios móveis – também chamados de consultórios de rua - especializados no primeiro atendimento aos usuários de drogas.
“Uma das estratégias são os consultórios nas ruas. Haverá profissionais [de saúde] em unidades móveis que irão para as ruas, sobretudo onde tem as cracolândias ou cenas de usos [de drogas], para fazer uma busca ativa nessas pessoas que são dependentes químicas, oferecendo tratamentos para elas”, disse o ministro, em entrevista à imprensa antes de discursar para trabalhadores e sindicalistas presentes ao 7º Congresso do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.
Segundo Padilha, 80 consultórios de rua já estão atuando nos grandes centros do país, e a expectativa é de o programa ser levado para outras cidades. “Os consultórios nas ruas vão avaliar se a pessoa tem indicação de internação, se ela tem risco de vida. Sou absolutamente contra qualquer política de recolhimento compulsório. Isso não é feito pelo pessoal de saúde, mas por policiais que, as vezes, não estão preocupados sobre em qual lugar essa pessoa vai ficar. Temos a política de fazer uma busca ativa [por dependentes]. Em cada cidade, esse modelo estará adaptado à sua realidade”, disse.
O ministro declarou ainda que os consultórios de rua serão instalados em todas as cidades do ABC Paulista e também na capital. “Na conversa que tivemos com o prefeito [Gilberto] Kassab e com as secretarias municipal e estadual de saúde, acreditamos que houve interesse da prefeitura em apoiar a melhoria da rede de saúde, sobretudo as ações de sair em busca ativa, onde as pessoas estejam. O Ministério da Saúde quer ajudar o município a ter mais médicos, enfermeiros e profissionais nas ruas exatamente para que a primeira abordagem seja feita por profissionais de saúde”.
Segundo Padilha, a presidenta da República Dilma Rousseff tem exigido que esse novo plano de enfrentamento ao crack consista em uma ação conjunta, envolvendo os ministérios da Justiça, Educação e do Desenvolvimento Social, além da Saúde. “A presidenta tem exigido que esse plano tenha ações de vários ministérios. A presidenta Dilma, a ministra-chefe da Casa Civil [Gleisi Hoffmann] e o ministro da Justiça [José Eduardo Cardozo] têm coordenado esse detalhamento do plano. Queremos um plano que não seja só um anúncio de ações, mas medidas acontecendo de imediato”, disse o ministro sem detalhar quando o plano será lançado.
Durante discurso, o ministro falou também da necessidade dos estados “apertarem a fiscalização” sobre a Lei Seca, proibindo que pessoas alcoolizadas dirijam. “Se bebeu, não pode dirigir. Os estados que apertaram a fiscalização, como é o caso do Rio de Janeiro, reduziram em quase 30% os acidentes de carro e de moto”, disse.
Ao final Padilha destacou a necessidade de discutir formas de financiar a saúde no país e sugeriu que esse debate seja feito junto com a reforma tributária.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

"Maconha não é mais uma droga leve."



"Maconha não é mais uma droga leve"
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João Goulão
"Maconha não é mais uma droga leve"

Formulador da política de entorpecentes portuguesa, considerada uma das melhores do mundo, diz que a maconha está quimicamente mais potente e afirma que o Brasil não está preparado para a descriminalização
por Wilson Aquino
CRACK NO BRASIL
"A motivação para o tratamento poderia ser trabalhada", diz
Adetenção de três jovens fumando maconha no campus da Universidade de São Paulo motivou a rebelião dos estudantes – que terminou na delegacia – contra a polícia nas últimas semanas. Como tratar a questão das drogas é um tema sempre polêmico no Brasil, por isso a experiência internacional pode ser útil para o País. Atualmente, Portugal tem um dos melhores modelos do mundo de prevenção e combate aos entorpecentes. Apesar de a descriminalização do consumo ser o item de maior visibilidade, o sucesso do programa passa pela criação de uma rede específica para o dependente.
“Faz mais sentido tratar uma pessoa doente no sistema de saúde do que no prisional”, afirma o médico português João Goulão, 56 anos, presidente do Conselho de Administração da Agência Europeia de Informação sobre a Droga (OEDT) e do Instituto da Droga e Toxicodependência (IDT) de Portugal. Para o especialista, só descriminalizar o consumo não resolve. “O fenômeno da droga tem de ser abordado por um órgão, a Justiça ou a Saúde. Não podemos retirá-la da Justiça e não ter as respostas da Saúde”, diz ele, que há 30 anos trabalha na recuperação de viciados.
"Quanto mais cedo prevenirmos o consumo de álcool, menor a
probabilidade de a pessoa se tornar viciada em qualquer coisa"
"Antes tínhamos 100 mil usuários de heroína, hoje não chegamos aos 30 mil.
As drogas eram a primeira preocupação dos portugueses, hoje ocupam o 13º lugar"

ISTOÉ - Qual a porta mais comum para o jovem entrar nas drogas?

JOÃO GOULÃO - A escalada começa com bebida alcoólica, cigarro e maconha. Mas não é, necessariamente, sempre assim. Hoje, as pessoas têm procurado direto as drogas mais prestigiadas: estimulantes, como a cocaína e o ecstasy. Felizmente, a heroína está desprestigiada; os jovens assistiram à destruição das gerações anteriores, a depauperação física e mental, e a rejeitam. Infelizmente, o perfil do usuário da heroína é bastante semelhante ao do crack no Brasil. O fato é que, quanto mais cedo prevenirmos o consumo de álcool, menor a probabilidade de a pessoa se tornar viciada em qualquer coisa.

ISTOÉ - Maconha é uma droga leve?
 
JOÃO GOULÃO - Maconha não é mais uma droga leve. A maconha hoje tem uma concentração do seu princípio psicoativo, o THC, muito maior do que dez anos atrás. Aliás, nenhuma droga pode ser considerada leve. O que realmente interessa é a importância que a droga ganha na vida da pessoa. Se for dependente da substância, pouco importa que ela seja leve ou pesada. Por isso descriminalizamos o consumidor de todas as drogas.

ISTOÉ - Como a lei da descriminalização do consumidor foi implantada em Portugal?

JOÃO GOULÃO - A descriminalização foi proposta por uma comissão da qual fiz parte, passou no Parlamento e a lei entrou em vigor em 2001. O impacto das drogas na vida da comunidade baixou drasticamente. O problema da toxidependência era tão devastador que, quando aconteceu a descriminalização, o povo apoiou, pois quase todos tinham dependentes na família. Costumavam dizer: “Meu filho não é um bandido. É um desgraçado.” Antes tínhamos 100 mil usuários de heroína, hoje não chegamos aos 30 mil. A criminalidade ligada à dependência baixou. Tanto que, hoje, as drogas, que eram a primeira preocupação dos portugueses, ocupam o 13º lugar.
 
ISTOÉ - Antes da lei o que era feito com os dependentes?
 
JOÃO GOULÃO - Iam para o tribunal. Na maior parte dos casos, não eram condenados à prisão. Os juízes optavam por penas alternativas ou tratamento compulsório em unidades terapêuticas. Não existe nada pior do que uma lei que não é cumprida. A lei determinava a reclusão, mas os dependentes não eram condenados à cadeia.

ISTOÉ - O sr. acredita que Brasil esteja preparado para descriminalizar o consumo de drogas?
 
JOÃO GOULÃO - Eu diria que no Brasil há uma carência de respostas públicas. O fenômeno da droga e da dependência tem de ser abordado por algum órgão, a Justiça ou a Saúde. Não podemos retirá-la da Justiça e não ter as respostas da Saúde. As próprias autoridades policiais, ao terem uma abordagem mais amigável em relação aos usuários, necessitam de estruturas de saúde que possam se ocupar deles. Senão, fica o vazio: nem há perseguição policial nem oferta de tratamento.

ISTOÉ - A tolerância com as drogas no mundo do entretenimento não é uma influência negativa para os jovens?

JOÃO GOULÃO - É um mau modelo. Procuramos contrabalançar isso convidando alguns artistas para participar de campanhas. O problema é que depois se descobria que eles também eram usuários. O nosso trabalho preventivo é permitir que as pessoas façam suas escolhas informadas. Usar ou não usar é uma questão individual. Mas consciente dos riscos.
 
ISTOÉ - Como funciona a política de drogas em Portugal?
 
JOÃO GOULÃO - O sistema de cuidados com a saúde dos toxicodependentes é dos mais perfeitos do mundo. Pena que somente seja referida como exemplar a questão da descriminalização, que está longe de ser a nossa melhor estratégia. É apenas um componente importante, mas só demos esse passo depois de termos fixado a responsabilidade de lidar com o problema no Ministério da Saúde mais do que no Ministério da Justiça. O dependente é doente, precisa de ajuda médica e não de prisão. O interessante da descriminalização foi tornar nosso sistema coerente. Temos uma população de dez milhões de habitantes e uma rede de saúde dedicada apenas aos usuários de drogas que envolve cerca de dois mil profissionais, 70 unidades de ambulatório em todo o país e mais de 100 unidades terapêuticas com cerca de dois mil lugares disponíveis. Tudo gratuito.
 
ISTOÉ - E qual é o papel da polícia nesse processo?

JOÃO GOULÃO - É assim: o usuário está consumindo a droga e é interceptado pela polícia. Dali, é conduzido à delegacia, onde é identificada a substância. Se tiver mais do que a quantidade considerada para uso pessoal, presume-se que seja tráfico e ele vai para o sistema criminal. Existe uma tabela para cerca de dez dias de consumo que dá 15 gramas de maconha, cinco de haxixe, uma de heroína, etc. Se tiver menos, é usuário e será intimado pela polícia a se apresentar em uma comissão do Ministério da Saúde chamada Comissão para Dissuasão da Toxicodependência, constituída por um jurista, um psicólogo e um assistente social. A pessoa é obrigada a se apresentar em três dias. Primeiro, avalia-se se é um dependente ou um consumidor de ocasião. No caso do dependente, a comissão o convida para se tratar. O dependente vive dividido entre o desejo de parar e a vontade de consumir. Um pequeno empurrão pode ser determinante para que se aproxime do sistema de saúde ou da droga.

ISTOÉ - Não fica o registro da passagem dele na polícia?

JOÃO GOULÃO - Se o dependente aceitar o tratamento, o processo é suspenso por alguns meses e não é aplicada nenhuma sanção. Se nesse período ele não voltar a ser interceptado pela polícia consumindo droga, o processo é extinto, sem deixar rastro, registro criminal, sem mancha alguma na vida pregressa dele.

ISTOÉ - E se for pego novamente?

JOÃO GOULÃO - Aí pode ser aplicada uma penalidade. No caso do dependente, nunca é multa em dinheiro. Pode ser proibição de frequentar determinados locais, privação de benefícios sociais, pode ser proibido de viajar para o exterior, de dirigir. É uma lista longa, que inclui ainda trabalho comunitário. Prisão nunca.

ISTOÉ - Não há internação?
 
JOÃO GOULÃO - Quem assumir o acompanhamento do dependente discutirá com ele qual a melhor via de tratamento, e a internação é uma delas. O nosso problema principal é a heroína e, neste caso, trata-se da terapia de substituição pela (medicação) metadona. Há várias outras modalidades terapêuticas.
 
ISTOÉ - E quanto aos consumidores recreativos?

JOÃO GOULÃO - A equipe técnica tenta identificar quais os fatores que levam a pessoa a caminhar para a dependência. É avaliada a história familiar, social e o perfil psicológico do indivíduo. A intenção é interromper o mais precocemente possível esse trajeto.

ISTOÉ - E se eles voltarem a se drogar?
 
JOÃO GOULÃO - Se reincidir no período de suspensão do processo, terá a obrigação de se apresentar periodicamente ao sistema, onde será avaliado. Se continuar, pode ser multado em até 500 euros e receber outras penas.

ISTOÉ - Vocês tratam somente os usuários flagrados pela polícia?
 
JOÃO GOULÃO - Não. Essa é uma das vias de acesso ao nosso sistema de tratamento.Tratamos por ano sete mil pessoas encaminhadas pela Comissão de Dissuasão. E temos por volta de 50 mil pessoas em tratamento nos nossos centros. Muitos vão voluntariamente, enviados por médicos ou pela família. É um sistema forte. Nosso orçamento é de 75 milhões de euros por ano. Atualmente, estamos com algumas dificuldades em função da crise econômica, mas temos conseguido sucesso. Tanto que há três anos estendemos nosso programa aos dependentes de álcool.

ISTOÉ - E a reação dos policiais?
 
JOÃO GOULÃO - A polícia não via sentido em prender viciados. Ela não tem mais que instruir processo nem fazer investigação sobre dependentes. A polícia passou a ter mais tempo para se dedicar às investigações sobre o grande tráfico. A eficácia aumentou enormemente na apreensão de carregamentos de drogas.
 
ISTOÉ - Não se prende o usuário, mas como ele compra o que é proibido?
 
JOÃO GOULÃO - Os traficantes passaram a fazer mais viagens. Em vez de andar com grandes quantidades, carregam o mínimo. Caso sejam interceptados, alegam que é para consumo próprio. Mas, se a polícia tiver evidência de que era para venda, mesmo com as quantidades toleradas, ele vai para o sistema prisional. Assim como pode ocorrer o contrário. O sistema é flexível.

ISTOÉ - Na Holanda existem cafés e bares que vendem maconha. Em Portugal existe isso?
 
JOÃO GOULÃO - Não. A Holanda não descriminalizou o consumo. Foi uma tentativa de separar o comércio das drogas ditas leves das pesadas e para isso foi autorizada a venda das chamadas drogas leves. Mas a coisa não ocorreu como se esperava. Muita gente ia para a Holanda somente para se drogar, é o turismo da droga! Os holandeses já determinaram que pessoas de outros países não podem mais comprar maconha no coffee shop. Mais dia, menos dia, haverá proibição total.

ISTOÉ - Qual a sua avaliação sobre o modo como o Brasil trata seus dependentes?

JOÃO GOULÃO - Parece-me necessário um esforço extra para haver respostas de saúde dirigidas à população dependente, como acesso facilitado a tratamentos. As instituições de saúde generalistas não têm capacidade de atender esse público. É complicado uma mesma unidade atender uma grávida e um drogado. No Brasil seria bom criar uma ampla rede de centros, mas pelas dimensões do País é difícil. Cada Estado ou município deveria assumir essa responsabilidade.
 
ISTOÉ - Menores das Cracolândias são internados à força. Como avalia isso?

JOÃO GOULÃO - O tratamento compulsório é complicado. Poderiam ser criadas instâncias em que fosse trabalhada a motivação para o tratamento.

Qual o efeito da psicoterapia no cérebro?


O efeito da psicoterapia no cérebro.

Selma Boer e Maria Alice Fontes



A explicação sobre o comportamento e as emoções do ser humano sempre foram alvo de investigação desde os tempos da Antiguidade. A trajetória das neurociências, um campo de estudo que busca explicar as relações entre o  comportamento e a atividade cerebral, vem se desenvolvendo rapidamente devido ao avanço do aparato tecnológico e médico-científico.

Quais os principais avanços das neurociências?

O avanço da tecnologia possibilitou o desenvolvimento de técnicas de neuroimagem, como Tomografia por Emissão de Pósitron (PET), a Ressonância Nuclear Magnética Funcional (fMRI) e a Tomografia por Emissão de Fóton Único (SPECT), que têm sido cada vez mais utilizadas em pesquisas científicas sobre o funcionamento cerebral associado aos transtornos mentais e seu tratamento. Através desses métodos, é possível conhecer as estruturas e o funcionamento cerebral in vivo.

Um dos resultados desse avanço foi a descoberta de que há uma neurobiologia das emoções, caracterizada principalmente pela presença de neurotransmissores, substância contida em um neurônio, secretada por ele e transmitida ao neurônio seguinte. Dessa forma, entendemos que a atividade neuronal, através dos neurotransmissores como a serotonina, a dopamina, a adrenalina, entre outros, tanto desencadeiam, como são reflexos do comportamento e das emoções humanas, funcionando num processo de retro-alimentação.

Qual o papel da psicologia dentro das neurociências?

A psicologia, como disciplina das neurociências, vê o funcionamento do indivíduo como reflexo da inter-relação entre a cognição, as emoções e o pensamento; assim, o comportamento e as emoções de uma pessoa são determinados, em grande parte, pela maneira como ela pensa sobre si mesma e sobre o mundo a sua volta. Quando há distorções cognitivas, ou seja, a percepção de si e do mundo encontram-se prejudicadas, surgem os distúrbios emocionais, e com elas a necessidade de tratamento.

A psicoterapia é o tratamento das desordens psicológicas e emocionais, através de intervenções cognitivas para promover o bem-estar das pessoas. A psicoterapia pode ser individual, familiar, em grupo ou de casal. Através das técnicas psicoterápicas, são apontadas para o paciente as distorções de pensamento relacionadas às suas dificuldades emocionais, buscando diminuir o sofrimento emocional, e favorecer o desenvolvimento de comportamentos mais ajustados.

Nos últimos anos, pesquisas do campo das neurociências têm buscado identificar os correlatos neurais associados aos sintomas de pânico, ansiedade e depressão e assim, conhecer os mecanismos biológicos envolvidos tanto nas doenças e também na psicoterapia. Neste sentido, as neurociências tem buscado  elucidar os efeitos da psicoterapia no cérebro, e as pesquisas realizadas até o momento têm comprovado que existem mudanças neurais subjacentes à psicoterapia, correlacionadas com a melhora dos sintomas dos pacientes.

Quais são os exemplos que a psicoterapia modifica o cérebro?

Um estudo recente com pacientes portadores de depressão (Ritchey et al., 2011), sem o uso de medicação, apontou que a psicoterapia promove um aumento global na ativação da córtex pré-frontal ventromedial, e maior excitação na amígdala, núcleo caudado e hipocampo (uma das regiões cerebrais envolvidas na expressão das emoções).

Outra pesquisa realizada na Universidade da Califórnia mostrou, através de estudos de neuroimagem, uma redução da atividade metabólica no núcleo caudado estrutura localizada no hemisfério cerebral direito, com papel importante no sistema de aprendizado e memória) em pacientes com Transtorno Obsessivo-Compulsivo, que passaram por psicoterapia no decorrer de 10 semanas.

No caso de indivíduos com fobias específicas (fobia de animais, de sangue), os estudos de neuroimagem (Porto et al., 2009) mostraram uma diminuição da atividade em áreas límbicas e paralímbicas do cérebro (responsáveis pelo controle emocional do comportamento, memória). Os achados de todas essas pesquisas apontavam para uma correlação com a melhora dos sintomas dos pacientes e mudanças na atividade cerebral.
Por que esses achados são importantes para a ciência?

Os circuitos cerebrais e nervosos são muito mais plásticos do que se supunha anteriormente. A psicoterapia cognitiva pode alterar o funcionamento cerebral de forma que as memória recolhidas pelo hipocampo são reorganizadas de uma maneira significativa pelos lobos frontais e consolidados novamente na memória. O processo de sentir alguma coisa, falar sobre isso, expressar as emoções, ligando isso a uma lembrança tem consequencias duradouras e benéficas para a qualidade de vida emocional dos pacientes.

O conhecimento de mecanismos cerebrais envolvidos na psicoterapia reforçam sua credibilidade como um método eficaz para tratamento dos transtornos emocionais e mentais. As técnicas de neuroimagem possibilitam identificar as principais vias neuronais implicadas nos transtornos emocionais, e assim favorecem o desenvolvimento de tratamentos mais apropriados a cada um deles.


Referências Bibliográficas

Cozolino J. The Neuroscience of Psychotherapy: Building and Rebuilding the Human Brain. Norton & Company Inc, 2002.

Ritchey M, Dolcos F, Eddington KM, Strauman TJ, Cabeza R. Neural correlates of
emotional processing in depression: changes with cognitive behavioral therapy and
predictors of treatment response. J Psychiatr Res. 2011 May;45(5):577-87.
Linden, DEJ. How psychotherapy changes the brain – the contribution of functional neuroimaging.
Molecular Psychiatry; 11, 528–538, 2006.

Peres, JFP.; Nasello, AG. Achados da neuroimagem em transtorno de estresse pós-traumático e suas implicações clínicas.
Rev Psiq Clín; 32 (4); 189-201, 2005.

Porto PR e cols. Does CBT change the brain? A systematic review of neuroimaging in anxiety disorders. J Neuropsychiatry Clin Neurosci.;  21:2, 2009.

Roffmann JL e cols. Neuroimaging and the functional neuroanatomy of psychotherapy.
Psychological Medicine; 35, 1385–1398, 2005.