Prêmio nobel fala sobre a dificuldade de fazer diagnósticos objetivos
de transtornos mentais
Folha de São Paulo - Rafael Garcia - de Washington
A
psiquiatria está em crise, porque falta comprovação biológica para seus
conceitos. Essa é a opinião do neurobiólogo Eric Kandel, 81, ganhador do
Prêmio Nobel de Medicina de 2000. O cientista, premiado por seus estudos com memória, desembarca nesta semana
no Rio de Janeiro para participar do Congresso Brasileiro de Psiquiatria.
Em entrevista à Folha, Kandel condenou o uso de remédios como a ritalina
(droga para tratar deficit de atenção) para melhorar a concentração de
pessoas saudáveis.
Ele falou também sobre a validade da psicanálise, que pode cobrir lacunas da
psiquiatria, caso adote padrões científicos mais rígidos. O pesquisador
comenta também sobre sua nova invenção: um camundongo
"esquizofrênico" para testar medicamentos .
Folha -
Psiquiatras estão debatendo mudanças no manual de diagnósticos de transtornos
mentais. Muitos acham que o livro não pode tentar ser muito objetivo. O que o
sr. acha?
Eric Kandel - A preocupação com a objetividade foi introduzida há uns 20 anos
quando houve uma tentativa de validar os critérios do manual para descrever
transtornos. Isso foi extremamente importante para que diferentes psiquiatras
pudessem dar o mesmo diagnóstico a um mesmo paciente.
Mas não houve muitos avanços desde então. Uma das razões para isso é que os
psiquiatras não têm os chamados "marcadores biológicos" à
disposição. Se você diagnostica diabetes ou hipertensão, pode usar medições
objetivas, independentes. Não precisa se basear apenas naquilo que o paciente
lhe conta. Nós, psiquiatras, ainda temos que recorrer à história do paciente.
Precisamos de sesperadamente de bons marcadores biológicos. Sem isso, podemos
publicar quantas edições quisermos do manual, que não chegaremos a lugar
nenhum.
A
esquizofrenia afeta capacidades mentais humanas. Como é possível usar um
camundongo para estudá-la?
A esquizofrenia tem três classes de sintomas. Há os "positivos"
-ilusões, alucinações e loucura-, os "negativos" -reclusão,
isolamento social e falta de motivação- e os "cognitivos" -a
dificuldade de organizar as ideias e trabalhar. É difícil criar um modelo
para estudar os sintomas positivos em cobaias, mas podemos modelar os cognitivos
e negativos.
Criamos um camundongo cujo corpo estriado [estrutura no núcleo do cérebro]
produz em excesso uma proteína que os neurônios usam para captar o
neurotransmissor dopamina. Essa é uma lesão genética que ocorre em parte dos
pacientes com esquizofrenia. Depois, encontramos um medicamento que supera
essa deficiência e a restaura ao normal. Achamos que isso poderá ser útil
para tratamentos de depressão também.
O que o
sr. acha de usar drogas, como a ritalina (receitada para deficit de atenção) para
"turbinar" a inteligência, aumentando a concentração?
Não acho que seja boa ideia para pessoas saudáveis. Esses remédios devem ser
prescritos para pessoas com problemas cognitivos. Essa drogas não devem nunca
ser vendidas sem receita. Não são vitaminas.
O sr.
vem falar no Brasil, onde a psicanálise é relativamente bem aceita. Nos EUA,
não é assim. Que papel o sr. vê para as ideias de Freud hoje?
Não vejo problema em ler Freud da mesma forma que lemos Nietzche, Dostoiévski
ou Shakespeare -grandes pensadores que escreveram sobre a mente humana. Mas
se você quer que a psicanálise seja uma terapia eficaz, é preciso ter estudos
que mostrem resultado. É necessário explicar o que ocorre no cérebro. Isso
seria trabalhoso, mas é precisa ser feito.
O maior problema não é com Freud, mas com aqueles que o sucederam. Eles não
desenvolveram uma tradição científica na psicanálise. O treinamento para
psicanálise deveria mudar, de forma que uma parte das pessoas formadas se
dedicasse exclusivamente à pesquisa.
Não
existe hoje uma aceitação maior de que a mente descrita por Freud possui
estruturas correlatas no cérebro?
Sim. O córtex pré-frontal está muito relacionado à moralidade e ao julgamento
de valores, por exemplo. Uma lesão nessa região do cérebro pode tornar uma
pessoa amoral, um psicopata. Mas acima disso, a ideia geral de Freud sobre
processos mentais inconscientes é muito importante para nossas vidas. Boa
parte de nossa atividade mental é inconsciente. Isso acabou se mostrando uma
verdade universal.
O sr.
passou a infância em Viena, quando Freud ainda vivia lá, sofrendo também a
perseguição nazista. Isso o influenciou em sua maior aceitação à psicanálise?
Isso teve efeitos positivos e negativos em mim. De um lado, parte de minha
vida era superar o transtorno do estresse pós-traumático, porque foi uma
experiência terrível. Mas eu fui influenciado pela cultura de Viena, tinha
muitos amigos cujos pais eram psicanalistas, e tinha interesse nisso.
Eu só desisti da psicanálise quando me apaixonei pela neurobiologia. E eu me
interessei pelos mecanismos de armazenamento de memória, porque é um assunto
central da psicanálise.
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Gostaria de perguntar: É POSSÍVEL QUE O USO DE FÓRCEPS NO PARTO ESTEJA LIGADO Á TRANSTORNO COMO DDA, HIPERATIVIDADE, BIPOLARIDADE E ABUSO DE DROGAS?
ResponderExcluirQue eu saiba não tem relação alguma com o parto, mas vc pode pesquisar na UNIFESP. Abraço
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