Bebês
dão pistas sobre as origens do conhecimento
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Pesquisadora de Harvard realiza experimentos para descobrir o que o ser humano já nasce sabendo e chega a conclusões impressionantes
Gazeta
do Povo - 05/05/2012 | THE NEW YORK TIMES
Sentada
numa sala de monitoramento alegre e apinhada no Laboratório de Estudos sobre
Desenvolvimento da Universidade de Harvard, Elizabeth S. Spelke, professora
de psicologia e uma pesquisadora proeminente da lista de ingredientes básicos
sobre os quais se constrói todo o conhecimento humano, lança um olhar cheio
de expectativa, enquanto seus alunos preparam uma menina de 8 meses de idade,
de cabelo escuro e enrolado e cheia de energia, para a tarefa onerosa de ver
desenhos animados.
O
objetivo dos pesquisadores, como em meia dúzia de outros projetos semelhantes
no laboratório, era explorar o que as crianças pareciam compreender sobre
grupos e expectativas sociais.
Cognição
Para
Elizabeth Spelke, linguagem humana é “ingrediente secreto”
Mais
recentemente, Elizabeth Spelke e outros colegas começaram a identificar
algumas das configurações básicas da inteligência social infantil. Katherine
D. Kinzler, agora da Universidade de Chicago, e Kristin Shutts, agora da
Universidade de Wisconsin, descobriram que bebês com apenas algumas semanas
de vida demonstram um gosto evidente por pessoas que usam padrões de fala aos
quais os bebês já foram expostos, e isso inclui sotaques regionais, entonação
e erres carregados (ou não).
Na
orientação dos primeiros aprendizados sociais, o sotaque é mais forte do que
a raça. Um bebê americano branco preferiria aceitar comida de um adulto negro
falante de inglês do que de um parisiense branco, e uma criança de 5 anos
preferiria fazer amizade com uma criança de outra raça que soasse como uma
criança local, do que com uma da mesma raça com sotaque estrangeiro.
Elizabeth
propôs que a linguagem humana seja o ingrediente secreto, o catalisador
cognitivo que permite que nossos módulos numéricos, arquitetônicos e sociais
juntem forças, troquem ideias e nos levem a horizontes distantes. “O que é
especial sobre a linguagem é seu produtivo poder combinatório”, ela disse.
“Podemos usá-la para combinar qualquer coisa com qualquer coisa”.
Ela
aponta para o fato de que as crianças começam a integrar o que elas sabem
sobre o formato do ambiente, seu senso de direção, com o que sabem sobre os
pontos de referência – cognição de objetos – justo na idade em que começam a
dominar a linguagem espacial e palavras como “direita” e “esquerda”. Ela
reconhece, porém, que suas ideias sobre a linguagem como o consolidador central
da inteligência humana ainda não foram provadas e permanecem um objeto de
disputa.
Mesmo
antes do processo começar, o objeto de pesquisa de quase 6 quilos deixou
bastante claro o escopo de seu cérebro social. Ela acompanhava as conversas,
encarava quem chegava e queimava nossos olhares adultos com o brilho de seu
sorriso. Elizabeth, que veio à sua posição de proeminência por delinear como
as crianças aprendem sobre objetos, números e território, balançou a cabeça
num gesto de assombro e autoironia.
Elizabeth
Spelke, de 62 anos, é alta e magra e divide seu longo cabelo no meio, como
uma aluna universitária. Quando fala, ela se inclina para frente e planta os
braços nas coxas, com as mãos uma na outra, parecendo, ao mesmo tempo,
profundamente envolvida e pronta para partir.
“Quando
as pessoas perguntam a Liz, ‘O que você faz?’, ela lhes responde, ‘Eu estudo
bebês’”, disse Steven Pinker, colega professor de Harvard e autor de Como a
Mente Funciona (Companhia das Letras), entre outros livros. “É engraçadinho, mas
ela dá a impressão de que faz pouco caso”.
O que
Elizabeth está fazendo mesmo, segundo Pinker, é o que os filósofos Descartes,
Kant e Locke tentaram fazer. “Ela está tentando identificar as categorias
fundamentais do conhecimento humano’.”
Elizabeth
estuda bebês não por eles serem bonitinhos, mas porque são a base de tudo.
“Eu sempre fui fascinada por questões de cognição humana e organização da
mente humana”, ela disse, “e o porquê de sermos bons com algumas tarefas e
ruins com outras”.
Elizabeth
é pioneira em utilizar o olhar dos bebês como uma chave para sua mente – isto
é, identificar as expectativas inerentes de bebês com até uma semana ou duas
de idade, medindo quanto tempo eles encaram uma cena na qual essas assunções
são desafiadas ou frustradas. “Mais do que qualquer cientista que eu conheço,
Liz combina a perspicácia teórica com um gênio experimental”, disse a colega
Susan Carey.
De
acordo com o laboratório de Elizabeth Spelke, os bebês em geral sabem, antes
de completarem 1 ano de idade, o que é um objeto: uma unidade física
distinta, em que todas as partes se movem mais ou menos como uma só e com
alguma independência dos outros objetos.
“Se eu
esticar a mão e pegar o canto de um livro, eu espero que o resto do livro
venha junto, mas não um pedaço da mesa”, disse Phil Kellman, o primeiro aluno
de pós-graduação de Elizabeth, agora na Universidade da Califórnia, em Los
Angeles.
“O
sistema visual vem equipado para dividir uma cena nas unidades funcionais de
que nós precisamos para a sobrevivência”, disse Kellman. Se você perguntasse
a um bebê se o seu saco com quatro laranjas lhe põe além do limite para o
caixa rápido do mercado, ele diria, “Você pega o saco, as partes ficam
juntas, logo é um item só, então, entre na fila”.
Os
bebês também sabem que os objetos não podem atravessar limites sólidos ou
ocupar a mesma posição que outros objetos, e que os objetos em geral viajam
pelo espaço numa trajetória contínua. Se você alegasse ter inventado uma
teletransportador como o de Jornada nas Estrelas, um bebê não iria acreditar.
O
laboratório de Elizabeth descobriu ainda que crianças pequenas não são boas
em utilizar pontos de referência ou a decoração para se orientar. Só depois
dos 5 ou 6 anos que elas começam a otimizar suas estratégias de busca com
pistas como “Ela escondeu meu brinquedo num canto cuja parede à esquerda é
vermelha em vez de branca”.
Tradução
de Adriano Scandolara.
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