Tráfico lidera internações na Fundação Casa
Diário
Web - São José do Rio Preto - Pierre Duart
Victor Augusto
Aos 13 anos Roberto
(nome fictício), iniciava a vida no crime, vendia “farinha” (cocaína) e
maconha, na periferia de Campinas, onde morava na época. Filho de pais
separados, o garoto de origem humilde, que era criado pela avó materna com mais
três irmãs, decidiu largar os estudos para ter mais dinheiro e respeito na
comunidade onde morava. Por quatro anos ele ficou impune até ser apreendido
durante tentativa de assalto. Atualmente ele cumpre medida socioeducativa na
comunidade Só Por Hoje, em Rio Preto e sonha em ser modelo e empresário.
Histórias como a do
garoto Roberto, 18 anos, são cada vez mais comuns. Nas três unidades da
Fundação Casa na região - Rio Preto, Mirassol e Fernandópolis - o tráfico de
drogas foi responsável pela apreensão de 113 menores em 2012, o que representa
76% dos internados nestas unidades. Número bem superior ao verificado em 2008,
quando 46 jovens foram encaminhados para a Fundação por tráfico, ou seja,
36%.
Para o defensor
público de Rio Preto, Júlio César Tanoni, o aumento de menores apreendidos por
tráfico de drogas é assustador. Segundo ele, a velocidade do crescimento mostra
que faltam políticas públicas para acolher os jovens em situação de risco. “O
perfil dos jovens na criminalidade é quase sempre o mesmo. O principal elo
entre eles é a falta de uma estrutura familiar. sem a família por perto o
Estado não consegue amparar o menor para lhe proporcionar opções de reintegração
social, educação e condições adequadas de vida. Sem esse apoio, os
adolescentes, que ainda estão formando o próprio caráter, acabam sendo levados
para o mundo do crime”, afirma Tanoni.
O defensor diz ainda
que uma vez apreendidos os jovens são “punidos” com um sistema ineficaz que não
colabora com a ressocialização. “A melhor alternativa seria a prevenção, mas se
isso não funcionou, é preciso fazer com que os jovens cumpram medidas sociais,
em liberdade. A Fundação Casa está sobrecarregada e não cumpre com o seu
papel”, explica.
A opinião do defensor
é a mesma do menor Roberto. Ele conta que quando foi pego pela polícia passou
30 dias internado na Fundação Casa. “Foram os piores dias da minha vida. Se eu
tivesse ficado mais tempo, tinha saído pior do que entrei. Lá é uma escola do
crime. Minha sorte foi que fiquei pouco tempo e depois passei a cumprir a
medida em liberdade assistida. Isso sim me fez mudar de ideia. Já tenho uma
profissão, trabalho como pintor e acabei de firmar contrato com uma agência de
modelos. Até o meio do ano que vem pretendo abrir minha empresa de informática
e games”, diz o garoto.
Para o juiz da Vara da
Infância e Juventude de Rio Preto, Osni Assis Pereira, a falta de fiscalização
nas fronteiras do Brasil, a deficiência da polícia na repressão ao tráfico e
falta de leis mais rígidas são os fatores principais para o crescimento no
tráfico de drogas no país.
“Ontem mesmo, das oito
audiências realizadas na Vara da Infância, todas eram de menores ligados ao
tráfico. Se as fronteiras fossem fiscalizadas e a droga impedida de entrar no
país, esse problema seria muito menor. Também precisamos de políticas públicas
melhores. Oferecendo educação de qualidade para as crianças, só assim o
problema poderá ser diminuído.”
O diretor regional da
Fundação Casa, Júlio Padovan, defende a instituição e afirma que no local os
jovens são encaminhados para cursos profissionalizantes, recebem acompanhamento
com especialistas de diversas áreas, como psicólogos, orientadores educacionais
e esportivos e assistentes sociais.
“Todo adolescente que
chega à Fundação é avaliado e um plano individual é traçado. Temos metas a
cumprir para que esse jovem se recupere. Além do interno, também atendemos à
família, junto com a rede de atendimento do município. Se identificamos a
dependência química do jovem o encaminhamos para os hospitais de referência e
assim por diante. Não deixamos de assistir esses adolescentes.”
Padovan diz que muitos
desses jovens são reincidentes, uma vez que ao cumprirem a medida socioeducativa,
voltam para suas casas, para o meio onde estavam e com isso, retornam a vida do
crime. “Se não tratarmos a família também não adianta muito. A saída para
diminuir a incidência de crimes são os investimentos em educação.”
Do América para a criminalidade
O sonho de ser jogador
de futebol foi o que levou Daniel (nome fictício) para as drogas aos 12 anos. O
garoto treinava no América de Rio Preto, então na categoria sub-13, há cinco
anos. As dificuldades financeiras da família o impediam de ir aos treinos.
Depois de pedir dinheiro na rua, vender balas e doces, o menor decidiu entrar
para o tráfico.
“Pedindo e vendendo
balas eu ganhava cerca de R$ 30 por dia. Quando comecei a vender crack, em um
dia fiquei com R$ 600. Nunca tinha visto tanto dinheiro na minha mão, fiquei
louco com tudo aquilo. Poderia ajudar nas despesas de casa, satisfazer minhas
vontades e treinar no América”, conta o garoto.
Hoje aos 17 anos,
“Daniel” está internado na Fundação Casa de Rio Preto há cinco meses. Essa foi
a primeira vez que ele foi flagrado no crime, depois de cinco anos vendendo o
que ele mesmo chama de “ilusões”. “Essa é uma vida de mentira. O poder, o
status são passageiros. Não vale a pena. Quero ir pra casa, ver minha família e
estudar bastante. Só penso no futebol, quero transformar o desgosto que dei
para minha mãe em orgulho e ganhar meu dinheiro honestamente”, afirma o garoto.
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